Ácidos graxos são moléculas orgânicas presentes nas células animais e vegetais necessários para a produção dos lipídeos de reserva (óleo de soja, gordura animal) ou lipídeos estruturais (fosfolipídeos e glicolipídeos das membranas celulares). Quimicamente consistem em ácidos monocarboxílicos, apresentando o grupo carboxila (-COOH) ligado a uma longa cadeia apolar. A cadeia apolar dos ácidos graxos pode ser saturada ou insaturada. A presença das insaturações (duplas ligações: -HC=CH-) conferem fluidez aos lipídeos em temperatura ambiente e são comuns em óleos vegetais. Parte desses ácidos graxos são poliinsaturados, ou seja, apresentam mais de uma dupla ligação entre os carbonos. Falando em relação a parte nutricional, existem alguns ácidos graxos que não são sintetizados no corpo e, desta forma, devem ser ingeridos pela alimentação. Esses ácidos graxos são chamados de ácidos graxos essenciais.
É possível estimar o volume gerado como coproduto durante a fabricação do biodiesel?
Os ácidos graxos são considerados um interferente na produção de biodiesel pois, devido a sua natureza ácida, consomem catalizadores alcalinos normalmente usados pelo processo de transesterificação clássica (NaOH ou KOH). Essa reação gera sais de ácidos graxos que na verdade são sabões. A presença dos ácidos graxos no óleo pode ser realizada por reações de titulação e sua quantidade é representada em termos de miligramas KOH necessários para neutralizar 1 grama de óleo. Esse parâmetro corresponde ao Índice de Acidez (método EN 14104), podendo ser determinado tanto no óleo quanto no biodiesel.
Existem diferenças desse volume conforme o tipo de matéria-prima (sebo e soja, sobretudo)?
A quantidade presente de ácido graxo durante o processo de produção de biodiesel está relacionado diretamente com a qualidade da matéria prima e suas características particulares. A presença de umidade na matéria-prima estocada favorece reações de hidrólise do óleo. Na reação de hidrólise ocorre liberação de diglicerídeos e ácidos graxos livres. Os ácidos graxos livres que são interferentes na reação de produção de biodiesel pelo consumo de catalizadores. Desta forma, pelas características distintas de origem, produção e estocagem das matérias-prima, espera-se maior quantidade de umidade e, consequentemente ácidos graxos livres no sebo em relação ao óleo de soja.
Quais são os processos tradicionais para lidar com o produto?
As principais soluções para resolver o problema do ácido graxo consistem no pré-tratamento da matéria-prima com a neutralização, lavagem e secagem do óleo. Óleos mais puros e de melhor qualidade, como é o caso do óleo de soja, requerem menor pré-tratamento da matéria-prima e garante processos de purificação mais simples.
Se for jogado fora, quais os tratamentos necessários?
Normalmente os ácidos graxos são recuperados na borra após os processos de neutralização, lavagem e decantação dos óleos. Na pior das hipóteses esse material deve ser destinado à produção de sabões. Hoje, todas as unidades de produção de biodiesel ou óleo já lidam com esse processo e possuem equipamentos destinados para essa separação.
Ou, se for vendido, que tipo de processo é necessário?
A 'borra acidulada' consiste em uma gordura subproduto do refino do óleo de soja. É uma excelente fonte de ácidos graxos que pode servir como matéria prima para aplicação em diferentes finalidades na indústria. Os processos necessários para o tratamento desse material dependem muito da sua aplicação final.
Embora esteja na academia, o senhor entende que a venda do ácido graxo pode ser lucrativa para as usinas, assim como já acontece com a Glicerina?
A venda de ácidos graxos pode fomentar uma nova linha de atuação para as usinas produtoras de biodiesel. Existe um grande mercado para os ácidos graxos que deve ser explorado. Analisando-se o valor de mercado dos ácidos graxos percebe-se que a remuneração é proporcionalmente muito maior em relação ao óleo ou biodiesel.
Há necessidade de alguma adequação das usinas para tornar esse coproduto viável?
As usinas ainda não estão preparadas para o trabalho com os ácidos graxos. Existe necessidade de adaptação de processos e adequação e desenvolvimento de colunas para purificação. Essas adequações vão depender da natureza da aplicação dos ácidos graxos e características da matéria prima utilizada: sebo ou óleos vegetais. Hoje no Brasil temos grandes especialistas nessa área capazes de apresentar soluções imediatas para a indústria. Luiz Pereira Ramos (UFPR), Donato Alexandre Gomes Aranda (UFRJ), Nelson Roberto Antoniosi Filho (UFG), Pedro Augusto Arroyo (UEMG), Fernando Wypych (UFPR), são apenas alguns desses pesquisadores capazes de desenvolver soluções nesta área.
Atualmente, quais seriam os mercados consumidores para os ácidos graxos?
1) Indústria Química, 2) Indústria de Alimentos, 3) Novos materiais (fiz comentário expandido abaixo).
Comentários Gerais.
Parte dos desenvolvimentos do NPDEAS consiste na produção de biodiesel de microalgas. Temos reatores patenteados capazes de produzir mais de 40 kg de biomassa seca de microalgas por mês utilizando uma pequena área instalada. Como parte de viabilizar o desenvolvimento deste biocombustível buscamos alternativas para a extração de óleo. Uma interessante possibilidade consiste na utilização da biomassa úmida na qual produzimos ácidos graxos a partir de reação de saponificação. Ao final do processo temos uma mistura de ácidos graxos isolados da biomassa de microalga que são transformados em biodiesel por reação de esterificação enzimática. Como principal característica, o óleo de microalgas apresenta em sua composição ácidos graxos poliinsaturados como EPA (ácido eicosapentaenóico 20:5) e DHA (ácido docosahexaenóico 22:6), fundamentais para os mamíferos para a síntese de prostaglandinas. A exploração da produção desses ácidos graxos a partir das microalgas, ou óleo de peixe, apresenta grande demanda na indústria (alimentos, suplementos e nutracêuticos).