DIFICULDADES E LIMITAÇÕES DA AVALIAÇÃO
DO CICLO DE VIDA (ACV)
MARISA DANIELE
SCHERER
INTRODUÇÃO
A
sustentabilidade do planeta é uma responsabilidade coletiva e para que se
cumpram essas responsabilidades são necessárias ações para a melhoria do meio
ambiente, o que resulta na adoção de práticas de produção e consumo
sustentável. Qualquer produto independente de que material seja oriundo
(madeira, vidro, plástico, metal ou qualquer outro elemento), provoca um
impacto no meio ambiente, seja em função de seu processo de produção extração
das matérias-primas que consome ou devido ao seu uso ou disposição final
(CHEHEBE, 1998), e diante da necessidade do desenvolvimento de técnicas mais
sustentáveis de produção surgiu a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), ferramenta
esta que avalia todas as etapas de um processo e/ou produto, desde o momento da
extração até a disposição final.
REVISÃO
DA LITERATURA
A
elaboração de um estudo de ACV permite desenvolver uma sistemática avaliação
das consequências ambientais associadas com um dado produto, analisar os
balanços (ganhos/perdas) ambientais, possível quantificar as descargas
ambientais para o ar, água, e solo relativamente a cada estágio do ciclo de
vida e/ou processos que mais contribuem, avaliar os efeitos humanos e
ecológicos do consumo de materiais e descargas ambientais para a comunidade
local, região e o mundo, comparar os impactos ecológicos e na saúde humana
entre dois ou mais produtos/processos rivais ou identificar os impactos de um
produto ou processo específico, também é possível identificar impactos em uma
ou mais áreas ambientais específicas de interesse (FERREIRA, 2004).
Segundo
Lima et al (2007) são diversos os setores produtivos que utilizam a ACV, tais
como: construção civil, automobilístico, embalagens, energia, agropecuário,
mineração, químico, etc., porém, não existe uma evolução progressiva dos trabalhos,
mesmo com o crescimento do número de estudos em ACV no período entre 2003/2004,
possivelmente em decorrência da publicação da primeira norma ABNT/ISO 14.040, o
que facilitou o acesso à informação sobre o tema
Pode-se
notar que a técnica de ACV possui diversas aplicações e nos mais diversos
segmentos, porem a sua aplicação encontra diversas dificuldades, como a falta
de profissionais capacitados e a principalmente a disponibilidade de bancos de
dados contendo informações de matérias-primas básicas, como energia, aço,
cimento, combustíveis etc., e isso
se
agrava no Brasil devido a escassez de dados brasileiros, onde emprego dessa
metodologia devido a falta de banco de dados pode levar a resultados de
confiabilidade questionável.
Outra
dificuldade da aplicação da ACV para a avaliação de impactos ambientais é
obtenção de informações e bases de dados confiáveis e completos para os
materiais utilizados em um processo ou produção de um produto, atribui-se esse
fato de que muitas empresas fornecedoras terem receio de divulgar seus
processos produtivos, cujos motivos podem estar relacionados a questões como
concorrência, plágio no processo produtivo ou transmissão de imagem negativa
associada à empresa. Alem disso, mensurar e analisar os impactos causados pelo
transporte de produtos, e segundo estudos realizados pelo IPCC (1988) o setor
de transportes é um dos grandes poluidores que ainda não implementa, de modo
significativo, projetos para mitigar os efeitos emitidos pela queima de
combustíveis, e no Brasil, o cenário se agrava devido a maior parte do
transporte de insumos ser realizado majoritariamente por via rodoviária e em
grandes distâncias.
A
ACV é uma técnica ainda em evolução, e por essa razão, análises comparativas de
processos ou produtos devem ser evitadas, onde nos casos de comparações levadas
ao conhecimento público, dadas as limitações da ACV, deve-se obedecer ao
estabelecido na norma NBR ISO 14040. Também deve-se ainda observar que, em
virtude da complexidade da ferramenta, podem existir ainda incertezas na
qualidade dos dados e nos seus resultados, além de haver um certo grau de
subjetividade decorrente da necessidade de julgamento e discernimento por parte
dos especialistas encarregados da condução do estudo, como também limitações de
conhecimento científico disponível.
Como
ressaltam Almeida e Giannetti (2006), para tornar a aplicação da ACV viável,
faz-se necessária a simplificação de alguns aspectos. Outra limitação da ACV
ocorre em virtude de esta não mostrar o sistema de uma forma dinâmica expressando
somente um determinado momento em que o sistema se encontra.
Almeida
e Giannetti (2006) complementam que uma ACV possui muitas fontes de incerteza,
como por exemplo, a escolha de uma unidade funcional equivocada, que pode levar
a distorção nas análises. E outra fonte de erro é a desconsideração de uma
etapa por deduzir incorretamente que esta não influência nos resultados finais.
Todas essas limitações interferem na confiabilidade dos dados, fazendo com que
os resultados finais não representem fielmente as condições do sistema.
De
acordo com Tibor e Feldman (1996), estes estudos são intensivos em tempo e
recursos, a coleta dos dados necessários pode ser complexa e a qualidade dos
dados obtidos pode não ser satisfatória. Para o autor, as relações de causa e
efeito no processo de avaliação
de
impactos são difíceis de descobrir, pois, mesmo sendo possível medir ou estimar
as entradas e saídas de um sistema industrial, nem sempre fica clara a ligação
existente entre estes fatores e os impactos ambientais, alem disso, Costa
(2007) menciona que a exatidão dos estudos também pode ser limitada pela
acessibilidade ou disponibilidade de dados coerentes ou pela qualidade dos
dados relacionada ao período de tempo e a área geográfica cobertos, as
tecnologias abordadas, a precisão e a representatividade dos dados.
Mesmo
com essas limitações, a ACV não deixa de ser uma ferramenta importante para a
identificação dos impactos ambientais causados pelos produtos, possibilitando,
a partir de sua interpretação, elaborar estratégias para redução desses
impactos e alternativas para melhoria de processos e produtos, e os benefícios
obtidos se sobressaem, pois as informações obtidas no estudo podem auxiliar no
processo de tomada de decisão, podendo desta forma contribuir para o
planejamento estratégico da organização.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Como
pode ser observado no referencial teórico, a ACV pode ser empregada nos mais
diversos segmentos, onde é possível comparar produtos disponíveis no mercado,
mostrar a carga ambiental associada ao ciclo de vida de um produto, ou mostrar
a importância relativa dos estágios do ciclo de vida do produto, e independente
de qual seja o motivo de sua aplicação, sempre pode trazer algum tipo de
benefício para a organização. Porem para obtenção dos benefícios que a ACV
proporciona, sua aplicação envolve uma série de etapas estabelecidas pelas
normas da ISO 14.040 a 14.044 como a definição do objetivo e escopo, análise do
inventário do ciclo de vida, avaliação de impacto e interpretação, onde estas necessitam
de tempo, recursos e recursos humanos qualificado para serem executadas. No
entanto, devido ao fato de que a ACV envolve várias questões ambientais, esta
ferramenta possibilita obter uma visão geral dos aspectos e impactos ambientais
associados ao produto, fornecendo subsídios que permitam a implementação de
melhorias em todo o seu ciclo de vida. E mesmo com sua complexidade de
aplicação a ACV é uma opção para o acompanhamento das questões ambientais
relacionadas aos produtos, e pode contribuir para o desenvolvimento
sustentável.
REFERÊNCIAS
FERREIRA, J. V. R..
Análise de ciclo de vida dos produtos. Disponível
em:<http://www.estv.ipv.pt/PaginasPessoais/jvf/Gest%C3%A3o%20Ambiental%20-%20An%C3%A1lise%20de%20Ciclo%20de%20Vida.pdf>
Acesso: em 16 maio 2013.
LIMA, A. M. F;
CALDEIRA-PIRES, A; KIPERSTOK, A.. Evolução dos Trabalhos de Avaliação do Ciclo
de Vida nas Instituições Acadêmicas Brasileiras. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL
CICLO DE VIDA, 2007, São Paulo.
COSTA, M. S. V.. O enfoque
de ciclo de vida como estratégia para a gestão sustentável: um estudo de caso
sobre pneus. 2007. 158f. Dissertação (Mestrado em Ciências em Engenharia de
Produção) – Universidade federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change. Relatório
estabelecido em 1988 pela Organização Meteológica Mundial – OMM e pelo Programa
das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA, para avaliar a informação
científica, técnica e socioeconômica disponível no campo de mudança do clima.
Cambridge Univ. Press., 1998.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
NORMAS TÉCNICAS. ISO 14040 – Gestão Ambiental - Avaliação do Ciclo de Vida –
Princípios de estrutura. 2001, 10 p.
CHEHEBE, J. R. 1998.
Análise do Ciclo de Vida dos Produtos: Ferramenta gerencial da ISO 14000. Rio
de Janeiro, Editora Qualitymark, 104 p.
TIBOR, T.; FELDMAN, I..
ISO 14OOO: um guia para as novas normas de gestão ambiental. São Paulo: Futura,
1996.
GIANNETTI, B. F.; ALMEIDA, C. M. B. V.. Ecologia
Industrial: Conceitos, ferramentas e aplicações. Editora Edgard Blücher, São
Paulo, 2006. ISBN 85-212-40870-5.
Texto desenvolvido pela bióloca Marisa Daniele Scherer, Bióloga, M.Sc., Doutoranda do NPDEAS no Programa de Pós Graduação em Engenharia e Ciência dos Materiais (PIPE) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) durante a disciplina 'Biocombustíveis' ministrada pelo Prof. André Bellin Mariano, D.Sc.